Grande demanda de erva-mate in natura para exportação é o principal motivo
O setor ervateiro passa por um momento delicado. De um lado estão os produtores de erva-mate, que com a grande procura de matéria prima, estão vendendo seus produtos a preços considerados altos pelas empresas. De outro, estão as indústrias ervateiras que sofrem com o alto custo da arroba do produto, assim como com o aumento de energia elétrica, embalagem e manutenção. A falta de matéria prima também é motivo de preocupação para os empresários.
Para o presidente do Ibramate, Alberto Tomelero, a indústria vive um momento de preocupação e nervosismo. “Com a grande valorização da erva in natura e a alta demanda, os produtores estão ganhando muito bem, já a indústria que processa essa erva para o mercado interno e para exportação, se encontra em uma crise muito grande. De outro lado ainda, temos os consumidores que, apesar da crise financeira provocada pela pandemia e o desemprego, ainda encontram erva-mate barata nos mercados”, explica.
Exportação
Segundo Tomelero, devido a problemas relacionados à estiagem, pragas e doenças em ervais, a Argentina precisou importar erva in natura do Brasil, já que sua produção caiu muito. “A Argentina está mais organizada que nós e conseguiu explorar novos mercados, com a falta de produto, conseguiu encontrar uma solução importando erva daqui”, ressalta.
O presidente ainda explica que o câmbio neste momento é favorável para a Argentina. “Não é comum vermos a Argentina importar erva do Brasil, já que é o maior produtor de erva-mate do mundo, mas em função da situação interna do país, se tornou mais barato comprar daqui, já que lá uma arroba de erva-mate custa em torno de R$45,00 e aqui encontramos produto à até R$25,00 a arroba”, aponta.
De acordo com ele, esta grande demanda de exportação trouxe uma série de transtornos, “a situação se inverteu, pois historicamente a erva de exportação era a erva de tererê, que era um produto que valia menos do que aquela usada para o chimarrão e isso traz complicações à indústria nacional, principalmente a aquelas que não exportam e que são a grande maioria. ”
A matéria prima oferecida pelos produtores é de boa qualidade, visto que está sendo utilizada para exportação. Porém, dessa forma as empresas, segundo Tomelero, são forçadas a pagar um preço mais alto pela arroba de erva-mate e não conseguem repassar esse valor para o mercado. “O consumidor nesse momento não aceita aumento de preço porque já vive em um momento muito delicado, com desemprego e baixo poder aquisitivo”, pontua Tomelero.
Conforme o presidente, os últimos lotes para exportação estão sendo carregados. No período de entressafra, a qualidade da erva-mate cai, já que possui muitos brotos e sementes. Segundo Tomelero, para continuar exportando, será preciso vender o que as ervateiras possuem estocado. “Temos certa preocupação porque não sabemos o que irá acontecer, o mercado está bagunçado, mas a expectativa é de que após esse período, teremos uma safra muito boa”, opina.
Dificuldades enfrentadas pela indústria
Os proprietários da ervateira Rei do Sul, de Arvorezinha, Flávia Spinelli e Renato Panis, contam que o mercado está muito disputado e a falta de matéria prima é fonte de preocupação. “Temos pouca erva-mate, considerando que grande parte da produção do nosso Estado está sendo comercializada para fora do nosso país e isso está inflacionando o valor da matéria prima”, esclarecem.
Segundo eles, a negociação entre ervateira e produtor é semelhante à de um leilão. “Quem paga mais tem produto para comercializar e quem está investindo nas praças e vendendo o produto pronto para consumo, não tem margem de lucro, pois não consegue repassar esse aumento ao consumidor final”, explicam.
Flávia relembra outro momento em que a indústria sofria com a falta de erva-mate. “Em 2013, quando ainda não estávamos no ramo, a demanda era maior do que a oferta e nessa época era normal encontrar o quilo de erva-mate pelo dobro do valor normal, mas mesmo assim, o consumidor continuou comprando, pois não se vivia a crise econômica e pandêmica de hoje”, lembra.
De acordo com os empresários, o custo de produção aumentou em 50% e o repasse desse custo ao consumidor chega a apenas 10%. “Caso aumentar mais, teremos que escolher entre aumentar o valor e diminuir quantidade de venda ou vender sem lucro para se manter no mercado, esperando que futuramente a situação normalize”, lamentam.
Flávia ainda pontua que como toda indústria, a ervateira também precisa trabalhar de acordo com uma programação semestral, sendo que as compras de insumos precisam estar alinhadas com as vendas. Segundo ela, para manter a qualidade dos produtos é preciso fazer um controle diário de estoque, “porém nos últimos 18 meses, tudo está muito incerto, quando temos a matéria prima, a venda diminui, quando temos venda, falta a erva-mate in natura e quando temos os dois, faltam embalagens”, conta.
Para eles, a esperança servirá de consolo e impulso para se manter o setor nos próximos meses. “Meu marido e eu não sabemos o que pensar ou como isso irá se desenrolar e nem o que acontecerá, mas temos esperança de que aos poucos tudo volte ao normal”, declara Flávia.
O presidente do Ibramate diz que a crise financeira precisa ser muito bem administrada pelas indústrias para que possam se manter, já que nas empresas “ganhar dinheiro ninguém está ganhando, acho que tem muita gente empatando e muitos perdendo, tanto é que sabemos que muitas empresas estão dispostas até a parar de trabalhar, arrendar as instalações ou vender”.
Projeção para os próximos meses
Segundo Tomelero, a indústria ainda deve passar por meses decisivos e complicados. “Na fase vegetativa o produtor não quer colher e as ervateiras precisam de matéria prima, e aí, teremos um rendimento muito menor que irá acarretar em custo mais altos para as empresas e esse será o momento mais difícil”, diz.
A oferta de matéria prima só deve aumentar no final do ano, na segunda quinzena de novembro, quando a fase vegetativa se encerra. “A indústria estará abastecida e os preços também devem diminuir”, vislumbra Tomelero.
O presidente do Ibramate ainda diz que a entidade entende a necessidade de criar um banco de dados com informações atualizadas e precisas sobre o cenário nacional e internacional, assim como de tendências de mercado. O intuito é de auxiliar e instruir a cadeia produtiva da erva-mate.
De acordo com ele, a região do Alto do Vale do Taquari é a maior produtora de erva-mate do Rio Grande do Sul e representa 60% da produção estadual. “Produto de qualidade nós temos, só precisamos trabalhar para aumentar o mercado consumidor e explorar novos horizontes, assim toda a cadeia produtiva será beneficiada”, finaliza.
Enquanto o Brasil foca na produção e na disputa pelo mercado interno, a Argentina foca na Exportação
O volume de erva-mate exportada do Brasil para a Argentina está batendo recorde histórico, segundo o jornal Lá Nacion da Argentina. Em contraponto, apesar da queda da produção argentina, os hermanos seguem batendo recordes de exportação de erva-mate para diversos países do mundo, tendo reforçado suas investidas no mercado asiático.
Para exportar, os brasileiros têm esbarrado na burocracia e na falta de expertise para alcançar o mercado externo. Com dificuldades de organização do setor e de entendimento, as batalhas internas têm consumido a energia dos brasileiros que estão mais voltados à produção da matéria-prima e ao abastecimento do mercado interno.
Enquanto isso, os argentinos têm ousado mais e desbravado mercados extremamente atrativos, como o da América do Sul, Europa e Ásia, apostando no uso da erva-mate no formato de chá. Tudo o que é enviado para a Ásia é 100% erva despalada, porque consomem em infusão. “Servimos o mundo da mesma forma que servimos à Argentina. Fazemos um desenvolvimento pensando no cliente”, ressalta o executivo Gustavo Quatrin, gerente geral da cooperativa Liebig, que insiste que embora chegue a todo o mundo (Austrália, Nova Zelândia, Alemanha, Espanha, Reino Unido, França e Estados Unidos),“o mercado interno está no comando”, afirma.
Há boas expectativas com a Índia. Quatrin aponta que com uma população de 1.3 milhões de habitantes abrem-se possibilidades semelhantes às da China, pois lá também o consumo é por infusão, embora usem mais em misturas e temperos, ou seja, se associam a erva com outros ingredientes.
O dirigente admite que, embora não exista uma “marca-país”, a Argentina é uma referência em erva-mate no mundo. É o país exportador número um. A exceção a esta consideração é o Uruguai, país cuja percepção de qualidade é o Brasil.
Para Quatrin, o cenário é promissor e as bebidas que o utilizam como insumo podem se tornar a maior demanda de exportação de erva-mate: a marca de energéticos Red Bull lançou o “Organic Viva Mate Red Bull” na Suíça, como teste-piloto para testar o mercado europeu. A Perrier (água do grupo Nestlé) já tem um energizante em lata, o Perrier Energize, que contém ingredientes de origem vegetal como café verde orgânico e extrato de erva-mate.
“Se esses desenvolvimentos industriais forem bem-sucedidos serão um antes e um depois da erva-mate, ela se transformará em um produto de consumo mundial nas mãos de bebidas e o mercado se expandirá muito fortemente”, prevê o executivo.
O país de 1,3 bilhão de habitantes que recebeu a primeira remessa de erva-mate argentina
Uma cooperativa de Misiones que administra a marca Piporé fez um embarque para a Índia; lá bebem em média sete xícaras de chá por dia e estima-se que o consumidor poderia substituir uma dessas sete xícaras por mate cozido.
A Cooperativa de Produtores de Erva-Mate de Santo Pipó SCL, que faz a marca Piporé, conta com 54 associados e exporta mais de 50% de sua produção. Até o momento registrou vendas para a Síria superiores a 460 mil quilos por mês e para o Chile com mais de 110 mil quilos por mês, entre outros destinos.
Segundo dados da empresa em seu site, a marca está entre as 10 yerbateras mais importantes da Argentina e entre as três exportadoras mundiais.