Grupo de apoio a dependentes de álcool realiza trabalho de apoio e acolhimento
Por Manoela Alves
O alcoolismo é uma doença considerada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), como a dependência do indivíduo ao álcool. O uso constante, descontrolado e progressivo de bebidas alcoólicas pode comprometer seriamente o bom funcionamento do organismo, levando a consequências irreversíveis.
O município de Camargo conta, há 30 anos, com o grupo de autoajuda Alcoólicos Anônimos (AA), tendo como um de seus membros mais antigos, Gilmar, que abre mão um pouco de seu anonimato, para incentivar pessoas e famílias que passam por este problema para que não se sintam sozinhas, mas sim, que tenham ajuda e acolhimento.
“Desde 1992 nós temos o grupo em Camargo, eu participo há 28 anos. Essa entidade teve início com apenas três pessoas, que frequentavam as reuniões em Marau e sentiram a necessidade de ter um grupo aqui no município também. Podemos dizer que em todos esses anos, o grupo sempre esteve ativo e sempre funcionou, por um período eu abri o grupo dentro da minha casa, buscando as pessoas para as reuniões, e hoje devido ao reconhecimento da sociedade e das famílias, com a quebra dos tabus, o AA cresceu, e o dependente é tratado com mais respeito”, explica.
E continua: “Hoje nós recebemos pessoas de outros municípios, pessoas que precisam de ajuda, e nós estamos aqui, respeitando o limite e a vontade de cada um”.
“O AA não faz nada por ninguém”
Essa é uma frase de impacto quando ouvida, afinal as pessoas estão lá buscando por ajuda, mas quando Gilmar a explica tudo fica claro. “Nós estamos aqui de portas abertas, mas o AA não pode fazer nada por ninguém sem a força de vontade e determinação de cada um. Nós, os membros, estamos sempre à disposição quando somos procurados pelas famílias ou pelo dependente. Nós somos a rede de apoio, mas a vontade de mudar precisa vir de dentro. O grupo mostra o caminho, cabe a cada um dar o primeiro passo, após essa decisão ninguém mais caminha sozinho”, define Gilmar.
Ele ainda explica que manter a discrição e o anonimato é fundamental para que o dependente se sinta integrado e protegido. Mas Gilmar, como um dos membros mais velhos do grupo, tem sua história conhecida por quase todos, por isso sempre é procurado por familiares e por aqueles que precisam de ajuda. “Eu escolho abrir mão do meu anonimato se isso for ajudar outras pessoas, para proteger o anonimato dos outros”.
Aceitação da doença pela família e pela sociedade
Hoje a sociedade tem uma visão diferenciada do que seja o grupo AA e dos membros que participam. “Antes haviam muitos julgamentos, considerando que o alcoólatra era apenas um bêbado, que não queria nada da vida. Hoje, com o reconhecimento da doença, o grupo se fortalece e com isso fortalecemos a cura também”, explana.
Há cinco anos, o grupo fez um trabalho em conjunto a Unidade de Saúde do município e profissionais da saúde, para que cada vez mais o alcoólatra seja visto como uma pessoa doente, que busca por ajuda e cura. “Algumas famílias ainda preferem não buscar ajuda, tentando resolver o problema dentro de casa, por receio ou vergonha. Não é vergonha nenhuma, pois cada um deste grupo passou e ainda passa por suas dificuldades, mas posso garantir que a vida, após o AA só tem melhorias”, sorri ele.
Um pouco da história de lutas e conquistas de Gilmar
Uma frase muito utilizada pelo grupo é: quando se admite o problema é o início para a recuperação, por isso a insistência de que o primeiro passo precisa ser individual, mas após a admissão, nenhum membro mais estará sozinho. “Quando você admite e nos procura, o alcoolismo deixa de ser um problema só seu e passa a ser do AA também”.
Gilmar ainda conta que quando tomou a sua decisão de parar de beber, há 28 anos, ele se programou para passar por tudo isso, e sua primeira atitude foi buscar por ajuda profissional.
“A minha esposa sempre me cobrava para parar de beber, mas eu não enxergava o problema na época, não entendia o quanto isso afetava a ela também. E o mais importante foi a minha filha, na época com três anos, que eu não conseguia nem a pegar no colo e isso dói muito. Então eu me programei para largar de vez a bebida”, conta.
Ele continua: “Chegou o dia que eu escolhi para me tratar e fui em direção ao médico, minha esposa me acompanhou, pois acho que ela não estava levando fé em mim. Em conversa com o médico, ele me disse que eu ficaria três dias internado e depois precisaria procurar o AA”.
Gilmar relembra que não estava muito animado para frequentar as reuniões, pois não acreditava na ajuda que poderia ter. “Eu lembrei, na época, de um ex-colega de trabalho que frequentava o AA e sempre colocava no ponto os convites para as reuniões. Eu e os outros ficávamos rindo e zoando ele, daí fiquei até com um pouco de vergonha de ir na reunião, mas eu estava decidido a parar de beber, então fui lá e encarei. Nas reuniões sempre é colocado três cadeiras, uma para o coordenador da reunião, outra para o secretário e uma no meio, vazia, que significa o Poder Superior. Eu pensei, tanto que eu rezei, procurei e pedi a Deus para me livrar da bebida e não conseguia, e quando eu cheguei no grupo, Deus estava ali, esperando por mim, para atender o que eu pedi”, lembra-se emocionado.
O grupo é de apoio e Gilmar destaca que sempre há um aprendizado, em tudo que é feito, em cada pessoa que os procura, e que a atitude precisa ser na hora. “Quando alguém me procura me contando seus problemas e dizendo que quer parar de beber, eu não deixo para amanhã, tem que ser na hora, a ajuda tem que vir no momento em que o dependente sente e pede ajuda, não podemos perder tempo e não podemos perder nenhum amigo, conhecido ou familiar para a bebida”, continua.
Ele fala emocionado que sua maior motivação foi sua família, em especial sua filha mais velha, que hoje é formada em psicologia. “Não consigo descrever o orgulho que sinto dela, pois ela sempre me acompanhou nas reuniões, ela viu a melhora no ambiente familiar e cresceu, estudou e hoje se dedica a ajudar outras pessoas, famílias e dependentes, pois percebeu desde cedo a importância do AA”.
Gilmar finaliza com o seguinte relato: “Eu busquei ajuda no grupo e sempre tive, mas afirmo, as maiores dificuldades que eu já passei foi estando sóbrio, porque quando o problema se apresentou eu não fugi para a bebida, mas encarei de frente. Minha família se tornou mais unida e conquistamos mais juntos. Eu sou grato ao grupo e muito grato a minha família, minha esposa e duas filhas. A luta é diária e constante, mas estamos lutando a cada dia”.
As reuniões do AA de Camargo ocorrem nas terças-feiras, às 19h, ao lado da Unidade de Saúde. Gilmar estende seu convite a todos que queiram conhecer o grupo e participar das reuniões.