Governadores e prefeitos argumentam que não têm condições de pagar um reajuste com esse índice
O reajuste anunciado pelo presidente Jair Bolsonaro na quinta-feira, 27 de janeiro, de 33,24% para os professores da Educação Básica está gerando preocupação e discussões entre gestores e a categoria.
Com o reajuste, o piso nacional da categoria passará de R$ 2.886 para R$ 3.845, o presidente afirmou que está cumprindo a lei. “Eu vou seguir a lei. Os governadores não querem os 33%. Eu vou dar o máximo que a lei permite, que é próximo disso”, afirmou o presidente.
Segundo a Secretária de Educação Básica (SEB), vinculada ao Ministério da Educação, mais de 1,7 milhão de docentes serão beneficiados pelo reajuste em todo o país.
Governadores e prefeitos estavam conversando com o Ministério da Educação argumentando que esse aumento pode causar um rombo nas contas públicas, já que são eles que arcam com os salários dos dois milhões de professores da Educação Básica Pública. Um levantamento da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), aponta que o reajuste de 33,24% pode provocar um impacto de R$ 30 bilhões apenas nos cofres municipais.
A lei atual tem como base a variação do custo/aluno do Fundeb, mecanismo de financiamento da Educação Básica, os gestores municipais e estaduais pediram a alteração da lei, para que o reajuste fosse pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor, que foi de 10,16% em 2021, e mantenha esse indexador para a correção nos próximos anos. No entanto essa alteração não foi feita.
Orientação da CNM
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) está orientando os prefeitos de todo o Brasil a ignorarem o novo piso salarial do magistério. De acordo com o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, não existe mais base legal para o reajuste de 33,24%, adotado pelo governo. Este é também o entendimento da Advocacia-Geral da União. Porém esse entendimento foi ignorado pelo presidente, que concedeu o maior aumento da história para a categoria.
Para a CNM os prefeitos devem corrigir o salário dos professores e dos demais servidores da educação em 10,16%, equivalente à inflação de 2021, medida pelo INPC. Esse é o índice que a entidade considera adequado e que tentou aprovar no Congresso como parâmetro para o reajuste do piso. O entendimento da assessoria jurídica da CNM é de que com a nova lei do Fundeb, o piso ficou sem parâmetro para reajuste e, portanto, seria necessária a edição de uma medida provisória ou a aprovação de um novo projeto de lei.
Ziulkoski considera que a decisão de Bolsonaro foi política. “Em nome de interesses eleitorais, nessa disputa insana com Lula, o presidente Bolsonaro está colocando em risco a educação brasileira. Pois os municípios não têm como bancar esse aumento sem comprometer outros investimentos em educação, já que o impacto será de R$ 30,5 bilhões ao ano. Para se ter ideia do impacto, o repasse do Fundeb para este ano será de R$ 226 milhões. Com esse reajuste, estima-se que 90% dos recursos do Fundo sejam utilizados para cobrir gastos com pessoal”.
Ainda em reunião com prefeitos, Ziulkoski criticou mais uma vez a decisão do presidente. “É muito fácil fazer favor com chapéu alheio”, disse o líder municipalista ao explicar que o governo federal não arca com nenhum recurso do pagamento dos professores da rede municipal ou estadual. Ele frisou ainda que a CNM não questiona o papel e a importância desses profissionais, mas contesta sim a falta de responsabilidade com a gestão da educação no Brasil. “A CNM está́ olhando para a educação. É dever do Estado garantir a manutenção do ensino e da própria prestação de serviços ao cidadão pela administração pública, mas, em ano eleitoral, para fazer palanque político, quem paga a conta novamente é o cidadão”, defendeu o presidente da CNM.
CNTE contesta posicionamento da CNM
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), divulgou uma nota de repúdio em relação as declarações do presidente da CNM.
A nota afirma que A CNTE formalizará denúncia ao Ministério Público (MP) para que as condutas do dirigente e da entidade sejam devidamente apuradas. Caso haja omissão ou demora do MP, ou não havendo retratação da CNM e de seu dirigente em relação à referida nota, a própria CNTE acionará a justiça.
Menos investimentos
O prefeito de Ilópolis Edmar Pedro Rovadoschi, afirma que o reajuste está fora da realidade dos municípios, e salienta que causará um desequilíbrio na folha de pagamento. “Ainda não tem nada de oficial quanto ao reajuste, não recebemos nada, não tem nada no Diário Oficial. E até não ter nada não vamos conceder. Penso que este reajuste está fora do padrão, e compromete a folha de certa forma para o restante dos funcionários, pois a folha é a mesma, e com esse aumento podemos chegar no teto legal da folha”.
O gestor argumenta que Ilópolis tem condições de pagar o reajuste, mas com a diminuição de investimentos na Educação. “Se esse reajuste realmente se confirmar vamos ter que rever todos os investimentos na Educação, temos obras em andamento, e temos outras programadas, porém com esse reajuste provavelmente vamos ter que deixar de executar”.
Ele continua afirmando. “Claro que entendemos que a categoria merece esse reajuste, assim como todas as outras categorias. Mas temos que ter responsabilidade e cuidar do orçamento, além disso, haverá um desequilíbrio entre o reajuste dos outros funcionários e dos professores. Penso que um reajuste de até 15% seria mais viável e justo”.
E finaliza. “Eu sempre digo para os funcionários que gostaríamos de dar 50% de reajuste, mas precisamos ter um equilíbrio, pois temos um limite da folha e não podemos ultrapassar, por isso a nossa preocupação”.
O reajuste não é real
No caso dos professores estaduais, o Governo do Estado concedeu um reajuste de 32% no mês de janeiro, porém esse reajuste não se aplica a todos os professores.
Segundo a professora Noeli Paludo Pagnussat, da Escola Felipe Ronan Ros, esse reajuste não é real. “Foi divulgado um aumento de 32%, mas na verdade não foi para todos, o índice ficou entre 5,5 e 32%. Grande parte dos professores receberam apenas 5,5%, isso depois de um período sem nenhum reajuste de sete anos, pois o último reajuste concedido pelo Estado foi em 2014”.
E explica. “A Lei Federal diz que todos os professores têm direito ao reajuste, porém com o último plano de carreira aprovado pelo governador Eduardo Leite, foi instituído um diferencial no nosso salário, no nosso básico tem o acréscimo de um subsídio e uma parcela de irredutibilidade. Então, nós recebemos o reajuste, mas a parcela de irredutibilidade foi estornada do nosso salário a receber. Ou seja, quanto mais tempo na carreira e maior a qualificação, menor foi o percentual de reajuste concedido”.
Noeli afirma que esse reajuste realmente é vantajoso para quem está iniciando a carreira. “Quem está iniciando agora vai sentir o reajuste, mas eu que tenho 38 anos tive apenas R$ 37,01reais de aumento. Esse reajuste foi divulgado como sendo algo inédito, um reajuste de 32% de uma só vez, mas infelizmente ele não é real. E isso, a sociedade tem que saber, pois todos pensam que agora a categoria teve valorização, mas não é bem assim. Por exemplo, o meu subsídio era de R$ 800 e após o reajuste ele passou para R$ 383,37, então isso nunca vai significar reajuste”.
Ação judicial
No entendimento do Cpers Sindicato, o Governo do Estado não cumpriu a Lei Federal, uma vez que o reajuste não atingiu o índice e nem foi para todos os professores.
A vice-diretora do 28º Núcleo do Cpers de Soledade Rosa Giovanoni afirma que o sindicato irá ingressar na justiça para garantir o reajuste. “O governador mandou um projeto de lei para a Assembleia Legislativa para conceder o aumento, que ficou em no máximo 32%, sendo que esses 32% é apenas para os contratados, pois quem tem plano de carreira não recebeu esse reajuste, então ele não está cumprindo a lei do piso do magistério. Por isso, vamos mais uma vez ingressar na justiça para garantir esse direito”.