O amor e persistência pelo local histórico contribuem muito para que o casarão se mantenha preservado por Vanda
Por Jaqueline Merlin
No caminho de quem segue para Linha Taquara é visível observar os casarões de madeira, antigos, de uma beleza extraordinária, que chamam muito a atenção de quem gosta de arquitetura ou curte a preservação porque entende que aquele lugar possui uma história que deve ser conservada, pois ela identifica aquele local, faz parte da cultura daquele povo que reside ali e serviu de ponto de chegada e de partida de muitos que passaram pela cidade antigamente.
Histórico
Em conversa com Vanda Elena Conci Mazzarino, 63 anos, viúva, ela conta um pouco da história de um dos casarões, o qual fica à esquerda da estrada que segue para a Linha Quadros. “Esse casarão foi construído na época de 1913, tem hoje em torno de 112 anos de existência”, comenta Vanda.
Os primeiros moradores do casarão, segundo ela, foram Antônio Preto, casado com Deomira Moretti Preto, que tiveram 13 filhos. A construção sempre teve no andar de baixo, parte da frente, comércio de produtos. Servia também de parada de tropeiros que cruzavam a região.
Quando Preto sofreu um AVC, a responsabilidade do casarão passou para os filhos Abel e Ângelo, que deram seguimento aos trabalhos do pai. Mais tarde quem assumiu os negócios foi Damiano Chiesa e Carolina Preto, genro e filha de Antônio. Seguindo a sucessão familiar, Edivaldo, filho de Damiano e Carolina, assumiram a responsabilidade.
Vanda mantém as portas do mercado abertas
Vanda comenta que já residia ali ao lado do casarão e, com o tempo, os negócios da família Preto foram diminuindo até falir. A família, já adoentada, foi residir em Garibaldi e colocaram a propriedade à venda. Vanda, juntamente com um cunhado, há 35 anos, adquiriu a propriedade e depois de algum tempo comprou a parte do cunhado, sendo até a atualidade a única proprietária do local. Ela comenta: “a casa permanece de pé porque a gente teima em trocar moeda e ficar com as portas abertas”.
O mercado do casarão está de portas abertas, vende produtos alimentícios e bebidas básicas e ainda é bem frequentado pelos moradores da comunidade, que têm o local como um ponto de encontro para tomar uma cervejinha, bater um papo, ler o jornal. Vanda conta que no início, logo que compraram, ela e sua família, como eram agricultores, abriam as portas do mercado mais no final da tarde, feriados e fim de semana. Agora, ela, viúva há 17 anos, não vai mais à roça e consegue abrir as portas do comércio durante a semana toda.
A contribuição dos tropeiros
É visível o amor que Vanda tem pelo casarão; ela se emociona ao contar a história de seu pai, que era um dos tropeiros de mulas da família Preto.
A contribuição dos tropeiros, na interligação de núcleos habitacionais, fomentando o comércio, criando uma nova cultura, com alteração de usos, costumes, crenças, etc., não se deu somente com as tropeadas de gado e mulas. Os tropeiros foram os responsáveis pelo transporte de todos os tipos de mercadorias, com exclusividade, até o surgimento dos barcos a vapor e mais tarde das estradas de ferro e rodovias. Os tropeiros e os carreteiros foram, durante duzentos anos, o que são hoje os caminhoneiros. Transportaram, criaram estâncias, plantaram vilas, alteraram o panorama do sul do Brasil colonial.
Vontade de preservar a história local
Talvez, inconscientemente, aí esteja o motivo de Vanda ter tanto apego pelo local. Ela sente que seus filhos não pensam como ela e comenta: “eu queria muito poder restaurar essa casa, preservar esta arquitetura maravilhosa que não é mais usada atualmente, preservar a história deste local, mas, não consigo, não tenho condições financeiras para isso. Se eu pudesse fazer, faria, por isso, mantenho as portas abertas do mercado, mesmo tendo pouco a oferecer; hoje em dia com a modernização as pessoas conseguem se deslocar com facilidade para fazer suas compras, mas aqui, procuro manter em funcionamento, vendo bebidas e algumas mercadorias de necessidades básicas, procuro manter viva a história, preservando como posso”, finaliza.
Vanda tem dois filhos, um deles se divide entre Putinga, onde trabalha alguns dias da semana e dá assistência para sua mãe, e Estrela, onde reside com sua família.
O casarão tem quatro andares, com escadarias internas, tem nove quartos nos andares superiores e outros ao lado do grande salão que é onde está o mercado. Descendo alguns degraus de escadas, se visualiza outros cômodos até chegar num ambiente aberto, amplo, com água canalizada e corrente que demonstram que ali era uma cozinha e área de serviço.