Ele atuou por 22 anos nas Obras, em diretorias de entidades, construção de obras públicas e testemunhou, ao vivo, os principais acontecimentos de Putinga ao longo das décadas
Por Divanei Mussio
Um senhor de 88 anos cuja história mistura-se com a história do município de Putinga. Assim pode ser iniciado o depoimento de Agostinho Guilardi, esposo de Helia Gema Zatta Guilardi e pai de seis filhos: Vanderlei, Carlos Alberto, Milton Carmine, Paulo Augusto, Gerson e Vinícius.
Ele tem uma vida rica dentro da comunidade, sempre ativo e atuante na busca de um lugar desenvolvido e próspero; exerceu cargos públicos, onde se destacam os 22 anos como secretário de Obras e o cargo de vereador, e há 65 anos é barbeiro na cidade, profissão que lhe garante saber de tudo um pouco, pois pelas barbearias circulam muitos clientes que, em conversas informais, colocam o barbeiro a par de tudo. Não é exagero afirmar que Agostinho é uma enciclopédia quando o assunto é a história de Putinga e seus fatos marcantes.
Atualmente, ele está cuidando de sua saúde e tratando de alguns problemas como coração, próstata e rins. Mas, ele tem muita coisa para contar, e consulta sua agenda para verificar os dados.
O início foi trabalhoso
“O início foi tudo através de serviço braçal, não existiam máquinas; as estradas e ruas foram abertas com picaretas pelos desbravadores. Com o passar dos anos, vieram os primeiros comércios e pequenas indústrias, como o frigorífico”, descreve, relembrando dos tempos que não somam mais que algumas décadas, mas que experimentaram mudanças profundas no seu decorrer. O avô de Agostinho foi um dos primeiros moradores do município.
Antigo criador de porcos, assim como outros pequenos produtores que vendiam os animais para o frigorífico Costi, o morador conta que a alimentação dos mesmos era toda do que era produzido nas roças dos próprios criadores. “Eles engodavam que era uma beleza e davam retorno. Hoje, 70% do lucro vai para a ração”, analisa.”
O pai de Agostinho faleceu jovem, 54 anos, e em função da saúde, se desfez de todo o capital da família, com os três filhos ainda pequenos; para sobreviver, colocou uma pequena “bodega”, com a ajuda de um amigo, herdada e continuada pelo filho. “Nossa vida foi melhorando, colocamos mais prateleiras, secos e molhados e até um salão de baile e construímos uma grande casa de comércio, que fechamos só depois que veio a cooperativa”, relata o idoso, relembrando os tempos passados da cidade e da família, feitas de trabalho, dificuldades e de superação das vicissitudes do caminho.
A agricultura foi o caminho escolhido pela família para obter o sustento a partir de então.
Mário Seixas
Quando o médico Mário Seixas chegou na pequena localidade e começou a falar em emancipação, logo foi cercado de adeptos da ideia; um deles foi Agostinho, que se tornou uma espécie de porta-voz da ideia inovadora, tendo recebido de Seixas a promessa de que, se obtivessem sucesso e o mesmo fosse eleito prefeito do jovem município, ele seria o secretário de Obras. E assim foi, depois de um curto período como vereador eleito. “Não tinha nada, nem máquinas, nem prédios para nós trabalharmos. Iniciamos construindo a garagem para a Secretaria, depois, os valos para o encanamento da água da Corsan, com picão e apás”, descreve o cidadão que acompanhou de perto desde os primeiros anos de Putinga, tendo ficado no cargo de secretário por 22 anos, participando das primeiras e fundamentais obras para que os primeiros passos fossem dados, como alicerces para o futuro.
Ele ainda destaca a construção das primeiras pontes, mais de 30, na cidade e no interior, cerca de 14 campos de futebol, 16 escolas, o ‘destacamento’, enumera, ao mesmo tempo que lamenta que poucos campos estão ativos e poucas escolas abertas atualmente: “lamentavelmente o governo fechou as escolas, o que não devia ter acontecido. Se tivessem escolas no interior, a rapaziada ficaria lá, ajudando os pais”.
Na emancipação do Município, houve uma comemoração discreta, e todos foram convidados. “O PTB foi fundado por meu pai e os ‘Çé’ eram do PSD, mas não existia essa rivalidade que tem hoje; todos eram amigos”, descreve, complementando que “teu conterrâneo é teu inimigo hoje, mas meu pai sempre disse que quando um prefeito ou vereador ganha, ele não tem mais partido político, o seu partido é o povo e os adversários políticos precisam ser respeitados, pois também pagam impostos e tem os mesmos direitos”, argumenta, comparando a política do passado com a do presente.
Usina
Agostinho, com sua excelente memória, lembra até de quem foram os pedreiros que construíram a usina Santa Lucia: Santo Mazzoco, o mesmo que fez os muros de sua atual casa, foi um deles. “Na década de 50, ela estourou porque não foi feito o estacamento correto, um erro grande do engenheiro responsável pela obra”, aponta. “Foi uma grande alegria quando a usina começou a fornecer energia elétrica para nós, afirma, informando que a usina de Putinga fornecia energia para o município de Encantado também. “Os postes foram todos colocados a braço, num trabalho meio insano”, relembra. Os bailes na casa de comércio da família aconteciam à luz de lampiões a querosene.
Quase dez mil habitantes
Putinga já chegou a ter quase 10 mil habitantes; hoje, segundo dados do IBGE, são 3. 747 habitantes. Agostinho determina as principais causas dessa despovoação ao longo das décadas recentes. “Falta de recursos, de indústrias, de empregos. Estamos morando no fim do ramal de asfalto, no fundo do mapa. Tínhamos moinhos, cooperativa, frigoríficos e tudo desapareceu. Não tem mais movimento e o pessoal começou a ir embora, buscando uma vida melhor e mais possibilidades de crescer. Até as famílias estão menores”, descreve melancolicamente, lembrando com verdadeiro saudosismo o grande número de jovens que se reuniam aos domingos nos campos de futebol para jogar ou assistir. “A gente tinha que se desviar para poder andar”, conta, lembrando dos tempos em que era dirigente e jogador do Clube Ruy Barbosa e do Tamoyo.
“Hoje, mal conseguem montar dois times de futebol; muitos campos viraram capoeira”, lamenta.
Hospital Dr.Oscar Benévolo e Igreja Matriz
“Eu era guri quando ajudei a construir o hospital; o primeiro hospital foi construído em outro local que não é o de hoje. O doutor Brunetto, de Ilópolis, vinha atender aqui em Putinga no começo”, segue contando, ressaltando que ajudou a construir outras tantas obras públicas na cidade.
Ele segue: “Meu pai e meus tios puxavam pedras para a construção, arrastando com uma ‘zorra’ para as primeiras construções: hospital, igreja, canônica e casas antigas. O primeiro pároco foi Domênico Carlino”.
Presente e futuro
Agostinho é pessimista quanto ao presente e ao futuro do município no momento; ele não vê possibilidades concretas para um desenvolvimento econômico e social a curto e médio prazo, e justifica: “não tem indústrias maiores; precisaria de mais umas quatro, cinco empresas do tamanho da Possebon. O frigorífico está parando, as serrarias são pequenas. Isso esvazia o município; o que as pessoas vão ficar fazendo aqui? As famílias também estão pequenas, com um, dois filhos”, pondera, analisando e avaliando o atual momento de Putinga. “As perspectivas para melhor não são boas, falta material humano. Mas é um lugar muito bom de se viver”, complementa.
Sua mensagem para os putinguenses, na sua geração mais jovem: “trabalhem, larguem um pouco do celular, que isso não traz um bom futuro. Os pais têm responsabilidade nisso, dão muita liberdade, não exigem respeito, falta comando para os jovens”. Isso tem que mudar”, afirma, do alto de suas muitas experiências de vida e sabedoria, preocupado com o que vem pela frente se as famílias não mudarem de rumo, na sua avaliação.